Luz de Vela - Uma Família no Mar
Navegue conosco e conheça um pouco da nossa história, movida pela simplicidade do vento, quase à Luz de Velas...
segunda-feira, 15 de abril de 2024
O Sexto Trecho: de Tapes a Porto Alegre
terça-feira, 20 de fevereiro de 2024
A Tempestade
Diário de Bordo
Como é bom reunir forças para abrir a pequena cortina, da pequena vigia do camarote de popa, depois de uma longa tempestade.
Ver o sol... sorrir... abrir os porões... fitar o horizonte... inspecionar o barco... ajustar o rumo e escrever a lista do por fazer.
"Bom governo, Timoneiro!" - brada no coração marinheiro a voz da Verdade.
Que assim o guia pela viagem da vida, indo aos picos e surfando aos vales, das marés que o fazem crescer.
Comte. Thom Colvara, MSA.
sábado, 9 de setembro de 2023
Depoimento
terça-feira, 15 de agosto de 2023
"Velejando o Brasil Hoje" - Quinto Trecho - De São Lourenço do Sul a Tapes
sexta-feira, 16 de junho de 2023
Fragmentos de uma Travessia
"Sempre será mais fácil desistir antes da partida. A tentação será por vezes incontrolável, as razões para ficar se multiplicarão. Haverá sempre apoiadores do abandono, nas horas mais áridas. Antes de partir, podemos achar que a desistência é uma opção segura; que os meses seguintes serão como os que passaram; que a vida seguirá como até então seguiu. Mas desistir é renunciar à chance de partir e à chance de descobrir que a vida pode ser muito diferente do que ela parece ser. Que o nosso peito pode aguentar mais trancos, que as nossas mãos podem ser mais precisas, que a nossa garganta pode projetar mais vozes, que os nossos olhos podem ver muito mais cores do que pensávamos ser possível."
Tamara Klink.
terça-feira, 13 de junho de 2023
quarta-feira, 12 de abril de 2023
"Velejando o Brasil Hoje" - Quarto Trecho - De Pelotas a São Lourenço do Sul
Diário de Bordo
16/02/2023, quinta-feira:
A viagem começou em terra firme. Depois de, sem sucesso, tentar captar alguma tripulação, o comandante Thom comprou sua passagem de ônibus de Florianópolis a Pelotas. Motivado pela condição metereológica favorável, aliada ao feriado de carnaval e ao Encontro Anual de Vela de São Lourenço do Sul (que aconteceria justamente neste período), o inquieto navegador consultou a família e decidiu comprar sua passagem terrestre, sem mais delongas. Ao entardecer de quinta-feira, desceu a montanha da base em Governador Celso Ramos/SC a pé, embarcou no primeiro ônibus até Florianópolis/SC e depois no segundo até Pelotas/RS. Foi uma boa e demorada viagem, que possibilitou um bom planejamento para a pequena travessia estimada em cerca de 12h.
Descendo a lomba
17/02/2023, sexta-feira:
Chegando em Pelotas, o comandante Thom foi recepcionado pelo comandante Jorge, do trawler Casulo, que gentilmente o levou até o Iate Clube Pelotas. Durante um necessário café, Jorge contara sobre o quase naufrágio do Casulo, que começou a fazer água imediatamente após colidir com uma pedra submersa, pelas imediações do Clube de Caça e Pesca de Pelotas, muito frequentado pelos navegadores locais. Por azar, durante a correria sobre os porões submersos, Jorge machucara as canelas ao cair em um porão aberto, coberto pela água. Por sorte, nada de grave, e o Casulo já se encontrava fora d'água para reparos no casco e pintura de fundo.
Ao longo do dia, o vento que soprava de sudeste aumentara bastante, o que requeria do comandante uma boa atenção à condição metereológica prevista para o dia seguinte, quando pretendia zarpar para São Lourenço do Sul. O vento era bom para uma travessia mais rápida, porém se muito forte, bastante trabalhoso para conduzir o Guará em solitário. Foram momentos de preparo e de certa apreensão. Ao meio dia, almoço na casa do comandante Jorge. O cardápio foi um delicioso macarrão com dobradinha (ou bucho, ou mondongo), derrubando neste navegador um preconceito de longa data quanto à iguaria que se apresentava. Estava delicioso!
Macarrão ao bucho!
À tarde, enquanto preparava o barco, surgiu um tripulante inexperiente, velejador "fresco" que procurava um barco para ganhar experiência. Prontamente, encaixou-se ao perfil do Guará e foi aceito, após brevíssima entrevista com diálogo de três palavras: quer, ir e sim. Mas, como o vento apertou, acho que ele pensou melhor e decidiu adiar a experiência. Novamente, estava solo.
Entardecer no Arroio Pelotas
Em virtude da difícil navegação pela Lagoa dos Patos, sobretudo naquele trecho, contemplado pelo Canal da Feitoria (uma região estreita, cercada por baixios, redes de pesca e intenso tráfego de navios), procurei por algum outro veleiro que estivesse indo ao encontro e, felizmente, encontrei dois, que iriam participar das regatas alusivas ao Encontro de Vela. Como eram barcos mais rápidos que o Guará, combinei com um dos comandantes de sair uma hora antes, para que fosse alcançado pelo caminho. À noite, preparei um jantarzinho a bordo com o salame que ganhei do comandante Jorge: o delicioso "Arroz Guará", prato tradicional a bordo do nosso barco sem geladeira, que consiste em um risoto preparado com salame ou carne seca. Enviei uma foto ao Jorge, que ficou indignado porque eu havia transformado o salame em linguiça. Ficou uma verdadeira delícia, acompanhada por um delicioso licor "esquecido" a bordo pelo Vovô Vande, em algum embarque perdido no tempo...
18/02/2023 - sábado:
Por volta das 7h, com o vento ainda fraco, soltei amarras e me despedi do amigo Gustavo, o "Mortoza", que carinhosamente tomara conta do Guará pelo período em que ficara aos seus cuidados em Pelotas. Um bom amigo, sem dúvida, destes que ficam no porto e no coração. "-Me chama pra cuidar do barco em São Lourenço" - disse sorridente. Mas sabíamos que, em um outro cais, novos laços são feitos, substituindo aqueles desfeitos. Para partir, é preciso soltar; para chegar, é necessário amarrar.
Muito obrigado, Pelotas! Até logo!!
Poucos minutos após o zarpe, já com a vela grande totalmente içada e navegando também a motor, contornamos a curva do Arroio Pelotas para, mais em frente, contornar a curva do Canal de São Gonçalo e adentrar novamente a Lagoa dos Patos. A cada esquina, um abraço de gratidão era lançado atrás. Que acolhimento tivemos! Quantos amigos fizemos!! Que experiências vivenciamos!!! Muito obrigado, Pelotas!!!! Até breve!!!!!
Velejando o Canal de São Gonçalo
Já na Lagoa dos Patos, o vento soprando de sudeste começava a ganhar força e firmar. Desliguei o motor de seguimos a panos, planando sobre aquelas águas turvas do grande "mar de dentro", como chamam os locais. Atento ao GPS, seguia a trilha sugerida pelo aplicativo Navionics, até que esta, em alguns trechos, começara a indicar a passagem por fora do canal. "-Opa... melhor continuar seguindo pelo canal indicado pelas bóias" - pensei. E assim fomos seguindo, eu e o Guará, até que de repente.... TUM! TUM! TUM! Encalhamos! Tentando entender rapidamente o que havia acontecido, para saber onde estava exatamente, vi que em um momento saí do canal, por não conseguir identificar a cor da bóia ao longe, que indicava o caminho pelo Banco da Sarangonha. A bóia vermelha, que deveria ter sido deixada pelo meu boreste (ou estibordo, à direita da embarcação), estava sendo deixada por bombordo. Enquanto "quicava" naquele fundo de areia dura, com quilha e leme tocando o fundo, liguei o motor com máquina à ré e percebi que o Guará se mexia. Uma ótima notícia, indicando que poderia sair. Enrolei a vela genoa (da proa), desci a vela mestra e observei um veleiro passando pelo canal. Chamei no rádio, informei minha profundidade e solicitei reboque, mas o comandante informou que não conseguiria chegar até ali, por justamente ser raso. Pedi a ele que continuasse por ali, enquanto tentaria sair a motor, para algum possível socorro. Um encalhe é sempre muito perigoso, pois os movimentos das ondas fazem com que o barco suba e desça repetidamente, batendo quilha e leme no fundo, de forma que, em algum momento, algum deles poderia abrir o casco e naufragar.
Atento ao GPS, com máquina atrás navegamos bem em cima da linha percorrida, voltando assim pelo mesmo caminho. Após uma grande volta para contornar o banco, consegui voltar ao canal e seguir navegando. Por Netuno, assistente divino para assuntos marítimos, avistei um rebocador bem próximo que navegava justamente em nosso rumo pretendido. Com vento bastante fresco, abri apenas a genoa e navegamos a incríveis 7 nós! Para não ultrapassar o rebocador, enrolava a genoa para reduzir a área vélica, diminuindo assim nossa velocidade. Seguimos a nau até o final do Canal da Feitoria, o trecho mais estreito da Lagoa dos Patos. Ali, uma encantadora mudança na cor da água abrilhantou aquele momento: de um escuro marrom, para um verde fascinante. Ao mudar o rumo para São Lourenço do Sul (seguindo ao norte iríamos a Porto Alegre), o vento entrou pelo través, o barco adernou divertidamente e seguimos velejando com grande alegria e bom ânimo a bordo, agora na reta final de nosso destino, programado para próximo das 17:00h em hora local.
Já próximo à barra do Arroio São Lourenço, fora possível avistar os pequenos veleiros monotipos participando das provas defronte à praia, na Lagoa dos Patos. Lembrei-me imediatamente de minha primeira viagem oceânica, como tripulante do grande amigo e capitão Mucuripe, quando atravessamos de Antonina/PR à Ubatuba/SP. Naquela ocasião, cruzamos exatamente pelo meio da raia, praticamente participando da prova por alguns instantes. Lembrei também, com muita saudade, da minha filha Isadora, treinando em um pequeno Optimist. Espero pelo dia em que poderei vê-la competindo com seu próprio barco, tomando suas próprias decisões, sentindo e controlando suas próprias emoções...
Durante este turbilhão de sentimentos, senti novamente a falta da flotilha que eu acompanharia neste difícil trajeto, sobretudo para quem nunca o fizera antes: ocorreu que um dos barcos decidira não zarpar, ao passo em que o outro zarparia apenas mais tarde, tendo chegado apenas à noite. Mas, o ônus de quem navega, muitas vezes, é se ver sozinho a bordo do seu barco, vencendo constantemente seus medos e tomando suas próprias decisões ante o desconhecido. Fiz contato com terra e fui informado de que o canal estava com bom acesso, em profundidade adequada ao calado do veleiro Guará. "-Aí entra até com balão em pé!" manifestou um entusiasmado velejador, já no clima da prova que participaria no dia seguinte. De olho no GPS, navegando exatamente em cima das marcas (aliás, um trabalho de batimetria* de grande valia realizado pelo velejador Christian na Lagoa dos Patos), segui até me encontrar com uma grande galhada exatamente em minha proa, bem sobre as marcas virtuais posicionadas na carta náutica digital. Naquele rumo, não poderia ir. Teria que guinar para boreste ou bombordo, sob pena de mais um encalhe. Olhei para a barra do arroio que nunca tinha adentrado antes e visualizei os molhes à bombordo, decidindo então deixá-los por boreste. Enquanto me aproximava um pouco mais da entrada da barra, bem devagar.... TUM! Outro encalhe!! Sem baixar nenhuma vela, com vento bastante fraco, dei máquina à ré e verifiquei que o barco não se movia, pois o fundo era de lodo. Na carta náutica, verifiquei que, ao desviar da galhada e julgar a entrada da barra em lugar errado, saí um pouco do canal, mas o suficiente para encalhar novamente. Acelerando o motor, ajudando com movimentos no leme, consegui aproar o barco novamente para o canal e caçar bem os panos, para adernar o barco o máximo possível, reduzindo assim o calado. Neste movimento, conseguimos navegar novamente... UFA!
Guará amarrado provisoriamente aos palanques em São Lourenço do Sul/RS
Seguimos em frente, adentrando o Arroio São Gonçalo, orgulhosos e estupefatos pela sobrevivência intacta à dois perigosos encalhes. Ao passo em que procurávamos uma vaga (que não encontramos, pois o clube estava cheio pelos veleiros que correriam as regatas das classes oceânicas nos dias seguintes), apreciávamos a beleza ímpar daquele belo e alegre canal, em um feriado de carnaval em pleno verão gaúcho. Amarrei então o barco a dois pilares, um à popa e outro à meia-nau, peguei um licor, algumas rodelas do salame do Seu Jorge e fiquei ali, admirando o entardecer. Sem desembarcar, preparei um pequeno jantar e descansei ali mesmo, deixando para apenas no dia seguinte dar entrada no clube.
Celebrando a chegada. Tim-tim!
19 a 21/02/2023 - de domingo à terça-feira:
Nos dias seguintes, permanecemos atracados ao mesmo local, aguardando pela disponibilidade de uma vaga. Para desembarcar, utilizei o novo bote de apoio do Guará, construído em polietileno, com banquinho e um par de remos de voga (remado com as costas para a proa). Enquanto estivemos ali, usava o bote também para ir à cidade, na outra margem do arroio.
Veleiro no Arroio São Lourenço
Do domingo e na segunda ocorreram as provas das regatas oceânicas alusivas ao "56º Encontro de Vela de São Lourenço do Sul". Um evento brilhante, dos mais incríveis que já tive a oportunidade de presenciar. Digo "brilhante", porque o Iate Clube possui também vagas para camping e motor-homes, de forma que os participantes das regatas permanecem no local ao longo de todos os dias do evento, com celebrações em ritmo de carnaval, em grande integração e grande festividade. Não à toa, o evento já encontra-se em sua 56ª edição, realizado anualmente, sem nenhuma falha. Uma grande festa náutica, abrilhantada pelos veleiros, seus comandantes e tripulações, frequentemente familiares. Por estar em solitário, sem tripulação, e considerar que os barcos já inscritos já contavam com suas tripulações organizadas, considerei melhor não participar das regatas, destinando meu tempo à conhecer a cidade, apreciar as festividades e arrumar o barco, que ficaria ali esperando até o próximo trecho. E assim, entre marchinhas de carnaval, churrascos e camaradagem, permanecemos ali aguardando a liberação de uma vaga segura para o veleiro Guará.
Evento de premiação. Parabéns aos velejadores!
Canoa furada!?
Presença nacional!
22/02/2023 - quarta-feira:
Acordei cedinho e fui até o portão externo do clube aguardar o motorista que me levaria até o ponto de encontro com minha carona de volta até Governador Celso Ramos. O Guará ficou aos cuidados do Sidnei, conhecido pelos amigos como "Sid", que mora ali mesmo com sua esposa a bordo de um catamarã e trabalha tomando conta dos barcos, realizando reparos gerais. Um grande sujeito, destes que a gente agradece por encontrar pelo caminho... né, Guará!? :)
A seguir, cenas dos próximos capítulos...
Para ouvir o podcast narrado pelo comandante, clique aqui
Obrigado pela leitura. Até a próxima!
*batimetria: ciência do mensuramento da profundidade das massas de água (oceanos, mares, lagos etc.) para determinação da topografia do seu leito.